27 junho 2007

Evitando guerras de água na Ásia

Brahma Chellaney
Em Nova Déli

A competição que se acirra na Ásia por fontes de energia obscureceu outro perigo: a falta de água em grande parte da Ásia está se tornando uma ameaça à rápida modernização econômica.
A água surgiu como questão chave que pode determinar se a Ásia se dirige para a cooperação ou para a competição. Nenhum país influenciaria essa direção mais do que a China, que controla o platô tibetano, fonte da maior parte dos principais rios da Ásia. As vastas geleiras do Tibet e alta altitude dotaram-no com os maiores sistemas de rios do mundo. Seus rios são fonte de vida para os dois países mais populosos do mundo - China e Índia - assim como Bangladesh, Mianmar, Butão, Nepal, Camboja, Paquistão, Laos, Tailândia e Vietnã. Esses países englobam 47% da população mundial.
Ainda assim, a Ásia é um continente deficiente de água. Apesar de abrigar mais da metade da população humana, a Ásia tem menos água doce - 3.920 metros cúbicos por pessoa - do que qualquer continente, com exceção da Antártica.
A disputa por recursos hídricos na Ásia foi reforçada pela disseminação da agricultura irrigada, indústrias intensivas no uso de água e pelo crescimento da classe média, que quer confortos que consomem água, como máquinas de lavar roupa e louça.
O consumo doméstico na Ásia está crescendo rapidamente, apesar de várias economias importantes sofrerem com grave falta de água.
O espectro de guerras por água na Ásia também está sendo ressaltado pela mudança climática e pela degradação ambiental na forma do encolhimento de florestas e pântanos, o que promove ciclos crônicos de alagamentos e secas. O derretimento da neve do Himalaia, que alimenta os grandes rios da Ásia, pode ser acelerado pelo aquecimento global.
Enquanto a briga no compartilhamento de água dentro das nações se tornou mais comum em vários países asiáticos, desde a Índia e Paquistão ao Sudeste asiático e a China - é o potencial conflito entre as nações por recursos hídricos que deve gerar maior preocupação.
Essas preocupações nascem das tentativas chinesas de represar ou redirecionar o fluxo para o Sul de rios do platô tibetano, ponto de início do Indus, Mekong, Yangtze, Yellow, Salween, Brahamaputra, Karnali e Sutlej. Entre os grandes rios da Ásia, apenas o Ganges começa do lado indiano dos Himalaias.
A disponibilidade desigual de água dentro de algumas nações gerou idéias grandiosas - desde ligar rios na Índia até desviar o Brahmaputra para o Norte, para alimentar as áreas áridas do interior da China. O conflito entre os países, entretanto, surgirá quando uma idéia for traduzida em ação para beneficiar um país às custas de um vizinho.
Com a intensificação da falta de água no Norte devido à agricultura intensiva, a China cada vez mais volta sua atenção para as abundantes reservas do platô tibetano. Ela represou rios, não só para produzir energia elétrica, mas também para canalizar as águas para irrigação e outros propósitos e atualmente está estudando projetos imensos de transferência de água entre bacias e rios.
Depois de concluir duas represas, a China está construindo ao menos três mais no Mekong, gerando reações apaixonadas no Vietnã, Laos, Camboja e Tailândia. Vários projetos chineses no centro-oeste tibetano têm efeitos no fluxo de água dos rios para a Índia, mas Pequim reluta em compartilhar informações.
Tendo contaminado extensivamente seus principais rios pela industrialização desenfreada, a China agora ameaça a viabilidade ecológica dos sistemas hídricos ligados ao Sul e ao Sudeste asiático em seu esforço para suprir sua sede por água e energia. O Grande Projeto de Transferência de Água Sul-Norte, que desviaria águas de rios tibetanos, tem o apoio do presidente Hu Jintao, especialista em hidrologia. A primeira fase desse projeto pede a construção de 300 km de túneis e canais para tirar água dos rios Jinsha, Yalong e Dadu, no limite oriental do platô tibetano.
Na segunda fase, as águas do Brahmaputra poderiam ser desviadas para o Norte, o que seria uma declaração de guerra pela água para a Índia e Bangladesh a jusante. De fato, Pequim identificou a curva onde o Brahmaputra forma o mais longo e profundo cânion do mundo antes de entrar na Índia como detendo as reservas maiores não utilizadas para suprir suas necessidades de água e energia.
O futuro das reservas de água do platô tibetano está ligado à conservação ecológica. Enquanto a fome da China por commodities primárias cresceu, assim também a exploração dos recursos do Tibet.
E enquanto a falta de água intensifica-se em várias importantes cidades da China, um grupo de ex-autoridades defende o redirecionamento das águas do Brahamaputra para o Norte, em um livro chamado "Tibet's Waters Will Save China" (As águas do Tibet salvarão a China).
Grandes projetos de hidrologia e a exploração irresponsável de recursos minerais já ameaçam os frágeis ecossistemas tibetanos, com operações de mineração começando a contaminar as fontes de água.
Enquanto a China parece decidida a perseguir agressivamente projetos de exploração de rios que cruzam nações, a prevenção de guerras por água exige uma estrutura de cooperação entre nações asiáticas que trabalhe pela propriedade comum dos recursos.
ahma Chellaney, professor de estudos estratégicos do Centro de Pesquisa privado de Política em Nova Deli, é autor de "Asian Juggernaut: The Rise of China, India and Japan" (O super-poder asiático: o crescimento da China, Índia e Japão).

Tradução: Deborah Weinberg


Fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/herald/2007/06/27/ult2680u525.jhtm (consultado em 27/06/2007).

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